1º de abril: Há 50 anos

Publicado por Redação em

Poemas do povo da noite

POEMA-PRÓLOGO

 

Fui assassinado.

Morri cem vezes

e cem vezes renasci

sob os golpes do açoite.

 

Meus olhos em sangue

testemunharam

a dança dos algozes

em torno do meu cadáver.

 

Tornei-me mineral

memória da dor.

Para sobreviver,

recolhi das chagas do corpo

a lua vermelha de minha crença,

no meu sangue amanhecendo.

 

Em cinco séculos

reconstruí minha esperança.

A faca do verso feriu-me a boca

e com ela entreguei-me à tarefa de renascer.

 

Fui poeta

do povo da noite

como um grito de metal fundido.

 

Fui poeta

como uma arma

para sobreviver

e sobrevivi.

 

Companheira,

se alguém perguntar por mim:

sou o poeta que busca

converter a noite em semente,

o poeta que se alimenta

do teu amor de vigília

e silêncio

e bebeu no próprio sangue

o ódio dos opressores.

 

Porque sou o poeta

dos mortos assassinados,

dos eletrocutados, dos “suicidas”,

dos “enforcados” e “atropelados”,

dos que “tentaram fugir”,

dos enlouquecidos.

 

Sou o poeta

dos torturados,

dos “desaparecidos”,

dos atirados ao mar,

sou os olhos atentos

sobre o crime.

 

Companheira,

virão perguntar por mim.

Recorda o primeiro poema

que lhe deixei entre os dedos

e diz a eles

como que acende fogueiras

num país ainda em sombras:

meu ofício sobre a terra

É ressuscitar os mortos

e apontar a cara dos assassinos.

 

Porque a noite não anoitece sozinha.

Há mãos armadas de açoite

retalhando em pedaços

o fogo do sol

e o corpo dos lutadores.

 

Pedro Tierra

Secretário de Cultura, Hamilton Pereira

 

Poemas do povo da noite

1ª edição, Editorial Livramento

3ª edição, Editora Fundação Perseu Abramo e Publisher Brasil

 

Categorias: Brasília

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