A organização acusa o governo da interina Jeanine Áñez de perseguir seu antecessor, Evo Morales, e seus apoiadores
O governo interino da Bolívia, liderado pela presidente Jeanine Áñez, está usando o sistema de Justiça para perseguir seu antecessor, Evo Morales, e seus aliados e apoiadores, disse a Human Rights Watch em um relatório publicado nesta sexta-feira.
O grupo disse que parecem ter “motivação política” as acusações de terrorismo contra o ex-presidente de esquerda. As acusações dizem respeito aos protestos que geraram tumultos na Bolívia depois que Morales fugiu do país em novembro, após sua vitória nas eleições presidenciais ser contestada.
As acusações contra Morales se referem a um único telefonema, feito dias depois de ele partir da Bolívia. Na ligação, o ex-presidente incentivou um apoiador a “combater” o governo interino, disse a HRW. Para a organização, a pena de 20 anos de prisão pelo suposto delito é “inteiramente desproporcional”.
A organização cita ainda as acusações de terrorismo feitas contra uma ex-advogada e chefe de gabinete de Morales, que também se basearam em um contato telefônico com o ex-presidente. Outra acusação é contra um apoiador de Morales acusado de insurreição por descrever o novo governo como “ditatorial”.
Ele também teve acesso a milhares de documentos legais e relatórios de polícia relacionados a 21 casos dos mais de 100 ex-membros ou apoiadores do governo Morales acusados de crimes como terrorismo, sedição, filiação a uma organização criminosa e desvio de conduta.
O Human Rights Watch, que tem sede nos Estados Unidos, disse ter entrevistado para seu inquérito o ministro do Interior, Arturo Murillo, e a ouvidora, Nadia Cruz, além de autoridades de Justiça durante seu inquérito.
A ONG também teve acesso a milhares de documentos legais e relatórios de polícia relacionados a 21 casos dos mais de 100 ex-membros ou apoiadores do governo Morales acusados de crimes como terrorismo, insurreição, filiação a organização criminosa e desvio de conduta.
Reflexos da eleição questionada
As ações da presidente interina da Bolívia contra opositores acontecem após uma eleição controversa no ano passado. Em outubro, Morales disputou a eleição presidencial contra o opositor Carlos Mesa, mas os resultados parciais, que deram vitória ao então presidente, foram questionados por observadores da Organização dos Estados Americanos (OEA). Meses depois, um estudo de pesquisadores dos Estados Unidos publicado pelo The New York Times questionou a conclusão da OEA sobre as fraudes na Bolívia.
Morales estava no poder desde 2006 e alterou as leis eleitorais para poder se candidatar novamente. Com a pressão da OEA e oposição do Exército, ele renunciou e fugiu da Bolívia. Áñez, que era senadora, se declarou então presidente interina.
A HRW disse ter descoberto indícios de que Morales também usou o sistema de Justiça contra seus oponentes durante seus 13 anos no poder, mas que Ánez “teve uma chance de romper com o passado” mas não o fez. Ao invés disso, seu governo pressionou juízes e procuradores publicamente “para fomentar seus interesses”, disse José Miguel Vivanco, diretor da HRW para as Américas.
“É crucial que as autoridades de Justiça não sirvam como uma ferramenta para perseguir os oponentes políticos de qualquer governo que esteja no poder”, argumentou.
As conclusões da HRW não farão muito para amenizar as tensões fervilhantes da nação sul-americana. Desde a eleição contestada no ano passado, o país ainda não elegeu seu novo presidente. A nova eleição presidencial que estava marcada para este ano foi adiada devido à pandemia do coronavírus. Agora, um novo pleito na Bolívia está marcado para 18 de outubro.
Na segunda-feira, um tribunal boliviano rejeitou uma apelação de Morales, que pedia a reavaliação de um veredito que o impede de concorrer a uma vaga no Senado. A Corte deu a justificativa de que ele não reside mais no país.