Ângelo perdeu a perna esquerda devido a um câncer, aos 17 anos. Ele conta que, quando recebeu o diagnóstico, teve nas mãos a decisão de amputar o membro. Como o câncer era agressivo e havia risco de morte, decidiu seguir a orientação médica.
À época, na adolescência e estudante do 3º ano do ensino médio, o maior medo era não conseguir fazer coisas comuns a jovens da mesma idade, como arrumar uma namorada.
“Tinha medo de ser diferente. Era época das garotas, estava começando a sair de casa, ir para festas. Foi um momento difícil”, conta o servidor público.
Mas, diferente do que imaginou, Ângelo logo conquistou uma companheira, com quem anos se casou em alguns anos. Depois de descobrir um novo tumor e passar por mais adversidades, decidiu começar uma faculdade de geografia. “Isso me fez esquecer a doença”, conta.
Em 2002, se separou e logo terminou a graduação. Chegou a Brasilia em 2006, quando passou no concurso público para o Departamento Nacional de Proteção Mineral (DNPM). Foi lá que conheceu a atual esposa, Isabel Carvalho, que trabalhava como jornalista no órgão.
Morador do DF Ângelo dos Santos, tem a perna amputada e subiu a Pedra da Gávea, no Rio de Janeiro, com a esposa Isabel Carvalho — Foto: Arquivo pessoal
Ângelo começou a praticar remo no Lago Paranoá, em Brasília, e chegou a competir na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro mas, em 2012 teve que parar porque começou a sentir dores no joelho.
Depois, começou a visitar cachoeiras e se apaixonou pelas trilhas da Chapada dos Veadeiros e de Pirenópolis, em Goiás.
“Comecei a viajar mais e aumentou meu gosto por fazer trilhas, a me desafiar. Até 2017, não fazia trilhas muito difíceis. Em 2018, fiz uma trilha no Parque Nacional, de 23 quilômetros. Percebi que conseguia fazer coisas difíceis”, conta Ângelo.
Com os desafios, o servidor público abriu um perfil no Instagram com o nome “Saci Trilheiro”. “É uma junção da brincadeira que fiz com o saci e a trilha. Foi bem aceito. A medida em que ia postando as aventuras, fui recebendo mensagens de incentivo, pessoas falando que se inspiram em mim”, diz Ângelo. Hoje, ele tem mais de 22,8 mil seguidores na rede social.
Morador do DF, conhecido como Saci Trilheiro, subiu 844 metros até o topo da Pedra da Gávea, no Rio de Janeiro — Foto: Arquivo pessoal
A ideia de subir a Pedra da Gávea surgiu de um amigo carioca do casal. Ele esteve em Brasília, em 2018, quando combinaram de subir juntos, mas o homem tinha um câncer e faleceu no ano passado.
“Na época, eu não sabia como era [a Pedra da Gávea], depois fui ver vídeos e estudar. Era uma das mais difíceis e desafiadoras do Rio de Janeiro. Subi com rapel ou escalando as pedras. Me preparei durante os últimos três meses, fui pra academia, fiz aeróbico”, conta Ângelo.
De acordo com o servidor, o tempo de subida até o topo da Pedra da Gávea é de, em média, três horas, mas eles demoraram mais. “Como era sábado e dia de sol, estava cheio de gente. Tinha que colocar equipamentos para subir e gastamos o dia inteiro. Começamos às 8h e saímos de lá às 19h”, conta.
“A sensação de propor um desafio desses e conseguir fazer é indescritível. Quando chega ao topo, dá a sensação de olhar para o passado e ressignificar tudo, pensar que valeu a pena. Passar pelas dificuldades teve o lado bom, que foi o aprendizado”, diz.
Ângelo ainda nem voltou para Brasília, mas já tem data para o próximo desafio. “Está agendado para 13 e 14 de setembro, vamos subir o Pico da Bandeira”, conta.
São 2.890 metros de altitude, a terceira montanha mais alta do Brasil, que fica entre Minas Gerais e o Espírito Santo. “Daqui a pouco as dores vão aumentar, a sobrecarga de só ter um pé vai me deixar mais cansado. Quero guardar material, porque quero dar palestras e poder ilustrar tudo”, conta.