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No final de março, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve viajar a Pequim para se reunir com seu homólogo chinês, Xi Jinping. O brasileiro, no entanto, decidiu não esperar a visita para conclamar a China para colocar fim ao conflito ucraniano.
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A proposta de Lula de formar um grupo de países para mediar o conflito contaria com a participação ativa de seus colegas chineses. Durante coletiva de imprensa ao lado do chanceler alemão Olaf Scholz, em 31 de janeiro, Lula citou Pequim nominalmente.
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“Nós queremos propor um G20 para debater o conflito Rússia-Ucrânia”, disse Lula na ocasião. “O Brasil está disposto a dar uma contribuição, e acho que a China joga um papel importante […] para a gente tentar criar um clube […] das pessoas que querem construir a paz no planeta.”
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Em 18 de fevereiro, durante entrevista à jornalista Christiane Amanpour, Lula disse que “no caso da Rússia e da Ucrânia, é preciso ter alguém que fale em paz. É preciso ter interlocutores para tentar conversar com as partes”.
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“Esse é o meu compromisso: eu agora vou visitar a China em março, e vou conversar muito com o presidente chinês sobre o papel que eles têm pra jogar na questão da paz”, disse Lula. “Eu quero falar em paz com Putin, com Biden e com Xi Jinping”, declarou Lula.
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A convocação da China pelo presidente brasileiro é clara. Agora, será que Xi Jinping tem interesse em assumir esse papel e atuar como mediador do conflito ucraniano?
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Especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil acreditam que a China tem interesse no fim do conflito ucraniano e não agiria contra a iniciativa de Lula de formar um grupo de países para debater a paz.
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“Recorde-se que o presidente Xi Jinping já declarou que a China está disposta a desempenhar um papel construtivo na solução do conflito”, disse o coronel da reserva e mestre em ciências militares, Paulo Roberto da Silva Gomes Filho, à Sputnik Brasil. “A influência econômica e energética sobre a Rússia, além das boas relações econômicas com a Ucrânia, conta a favor.”
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O especialista ainda nota que a China tem bom trânsito entre os países do chamado Sul Global, “o que também a fortalece como mediadora”.
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Por outro lado, a neutralidade da posição chinesa em relação ao conflito ucraniano pode ser contestada pelos países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Para Gomes Filho, o estabelecimento de uma “amizade sem limites” entre China e Rússia no início de 2022 seria um indicativo de que Pequim é aliada de Moscou.
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“A mediação, para ter maior possibilidade de êxito, deve ser feita por um ator que conte com a confiança e o respeito das partes em disputa. Para isso, é fundamental que seja reconhecido como uma parte neutra”, notou o especialista.
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O professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Bruno Hendler, concorda, e diz que a China pode não ser vista como uma mediadora em potencial pelos países da OTAN.
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“Os falcões americanos sempre verão a China como uma ameaça desestabilizadora, como o emergente revisionista”, lamentou Hendler.
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No entanto, no contexto regional chinês, “sabemos que os EUA geram muito mais caos no sistema do que a China”, considerou o professor.
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“Na região da Ásia-Pacífico, o adulto na sala é a China. A visita de Nancy Pelosi a Taiwan, os exercícios na Coreia do Sul, o rearmamento do Japão com apoio dos EUA – esses elementos mostram que a instabilidade tem sido causada muito mais pelo hegemon em declínio do que pela potência em ascensão.”
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Ao contrário dos EUA, que, segundo o jornalista Jamil Chade, não receberam bem os planos de Lula para mediar o conflito na Ucrânia, Pequim não atuaria contra uma ação brasileira para negociar, acredita Hendler.
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“Mas acredito que quando Lula fala sobre o papel da China como mediadora, ele tenha muito mais interesse em reposicionar o Brasil na arena global, do que em mudar o comportamento da China ou dos EUA”, considerou Hendler. “É para apontar que o Brasil está de volta como um mediador responsável.”
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Relações Brasil-China
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A visita de Lula a Pequim, marcada para a segunda quinzena de março, atende a convite do governo chinês. Desde a posse do mandatário brasileiro a China demonstra interesse em estreitar o relacionamento bilateral: o vice-presidente chinês, Wang Qishan, comandou a maior delegação internacional presente na posse de Lula, em 1º de janeiro.
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A China é o maior destino das exportações brasileiras, com envios que totalizaram US$ 89,4 bilhões (cerca de R$ 462 bilhões) em 2022. Já o Brasil é o principal destino internacional de investimentos chineses: só em 2021, mais de US$ 5,9 bilhões (cerca de R$ 31 bilhões) foram investidos em mais de 28 projetos no Brasil.
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Para a professora da Escola de Assuntos Internacionais da Universidade O.P. Jindal, na Índia, Karin Costa Vazquez, a parceria estratégica com a China deve ir além da questão comercial e a incluir temas como governança global, desenvolvimento sustentável, ciência e tecnologia.
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“Existem algumas vertentes que eu acredito que podem ser as principais dessa nova parceria estratégica do Brasil e da China”, disse Costa Vasquez à Sputnik Brasil. “Nossas relações precisam ser reconstruídas e adensadas.”
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A primeira vertente é a econômica-comercial, na qual são necessários esforços “para promover a diversificação e agregação de valor das exportações brasileiras para a China”.
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“Precisamos reativar fundos chineses para expansão da capacidade produtiva do Brasil”, notou a especialista. “Anunciado em 2015, o fundo Brasil-China de US$20 bilhões (cerca de R$ 103 bilhões) ainda não financiou nenhum projeto e está parado por questões burocráticas.”
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Além disso, Pequim e Brasília têm interesses comuns na área de desenvolvimento sustentável e transição energética. Segundo a especialista, os países poderiam estabelecer um mercado comum de comercialização de créditos de carbono.
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“Em 2021, a China lançou o mercado nacional de carbono, cobrindo mais de 80% das emissões de CO2 do país”, disse Costa Vazquez. “O Brasil e a China podem desenvolver tecnologias e direcionar investimentos para projetos de sequestro de carbono nos países amazônicos.”
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Outra vertente da renovação da parceria estratégica seria a governança global, na qual Brasil e China estão empenhados no fortalecimento do multilateralismo.
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Os países poderiam “explorar a criação de uma Aliança para a Erradicação da Fome e da Pobreza, aproveitando a experiência do Brasil e da China […] e a importância da potência agrícola latino-americana para a segurança alimentar da China e do mundo”.
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Para a especialista, “o importante é aproveitar a liderança nacional e internacional de Lula para restaurar e ampliar a parceria estratégica para além da nossa tradicional pauta econômica e comercial”, concluiu.
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O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, deve visitar a China na segunda quinzena de março, de acordo com o Itamaraty. Durante a visita, realizada a convite do governo chinês, Lula deve se reunir com o presidente do país, Xi Jinping.
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