Por Estadão Conteúdo
A um mês do fim da gestão, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), busca oficializar sua principal promessa de campanha: tirar o chamado Arco do Futuro do papel. O petista vai encaminhar ainda nesta semana um projeto de lei à Câmara Municipal que propõe a reformulação de 6% do território da cidade, no eixo que vai do Parque São Domingos, na zona oeste, ao Belém, na leste, no também chamado Arco Tietê. O formato abre espaço para que concessões públicas e parcerias público-privada (PPPs) arrecadem verbas para viabilizar as obras.
Formulado como um Projeto de Intervenção Urbanístico (PUI), instrumento previsto no Plano Diretor aprovado em 2014, o negócio a ser proposto atinge 60 milhões de metros quadrados. A proposta também visa a permitir a alienação onerosa de bens públicos incluídos no perímetro, como o complexo do Anhembi, já alvo de interesse do setor privado.
Se for encampado pelo prefeito eleito João Doria (PSDB) a partir do ano que vem – não há mais tempo hábil para o tema ser discutido e votado na Câmara neste ano -, o PIU planejado por Haddad deve sofrer alterações. O tucano pretende, por exemplo, privatizar o Anhembi de forma independente, e não mais em uma concessão, como queria Haddad. Seus assessores não foram localizados ontem para comentar o tema.
O atual prefeito considera a aprovação do projeto importante para completar as ações que desenvolveu ao longo do mandato para viabilizar o Arco do Futuro. “A ideia era pegar as Avenidas Cupecê, Jacu-Pêssego, Roberto Marinho, do Estado e as Marginais e resolver a legislação urbanística delas. Cupecê e Jacu-Pêssego já foram resolvidas no Plano Diretor. Arco Tamanduateí está na Câmara há quase um ano, deve estar para votar. O que está faltando para completar esses grandes blocos era o Arco Tietê”, disse.
O petista afirmou confiar que seus projetos serão tocados pela próxima gestão. “Não vejo da parte da secretária nova (Heloisa Proença, que assumirá Desenvolvimento Urbano) a disposição de rever as linhas mestras do Plano Diretor, por exemplo. Até mesmo ela o elogiou publicamente, disse que é moderno, que é avançado. Acho que o Arco do Futuro está garantido.”
O Sindicato da Habitação (Secovi) informou que está analisando o projeto e mensurando seus impactos, mas não tem como julgá-lo. Não há ainda certeza de que o plano sairá do papel. Na Câmara Municipal, a única missão restante é a aprovação do orçamento do ano que vem, sem previsão de que se comecem as discussões desse projeto até nova legislatura.
Interesse público
O plano proposto por Haddad prevê que os valores recebidos de outorga onerosa de novos imóveis dentro do perímetro do Arco Tietê sejam “carimbados”: só poderão ser investidos dentro dos limites dessa área. E determina quais são as obras previstas, como alargamento de ruas e criação de parques voltados para a preservação dos leitos dos rios e mitigação de ilhas de calor.
É como se fosse uma operação urbana, com a diferença de que a verba para as obras só será arrecadada conforme a região seja adensada – nas operações urbanas, essa verba é arrecadada antes de que novos prédios sejam construídos, por meio da venda de títulos imobiliários chamados Cepacs.
O projeto afirma que a São Paulo Urbanismo, empresa de planejamento da Prefeitura, poderá intervir em concessões e parcerias público-privadas para arrecadar recursos para a viabilização do plano.
O secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Fernando de Melo Franco, afirma que a medida é diferente de uma concessão urbanística proposta, por exemplo, para a concessão da chamada Nova Luz – proposta da gestão Gilberto Kassab (PSD) que transferia para a iniciativa privada a elaboração de melhoras urbanísticas, mediante a permissão para realizar desapropriações para exploração imobiliária.
“Há uma concessão em curso, que é a do Anhembi, mas por ora é a única. Esse projeto não sela o destino dessa área. Dentro do projeto, há espaço para planos menores, que poderão ter projetos específicos.”
Ele diz que outras propostas de concessão de bens públicos nessa área também teriam de ser adaptadas à legislação. Cita, em tese, o Campo de Marte – alvo de disputa na Justiça entre a Prefeitura e a União. Esses planos também deviam contribuir para arrecadar recursos para viabilizar as obras.
O Plano Diretor prevê que projetos de intervenção urbana podem ser feitos por meio de concessão urbanística apesar de o dispositivo não estar previsto no projeto de Haddad. O instrumento não é consenso entre arquitetos. “É um instrumento permissivo, que não define muito bem qual o interesse que deve prevalecer, se o público ou o privado”, diz a urbanista Lucila Lacreta, do Movimento Defenda São Paulo. “As empreiteiras sempre demonstraram interesse nessa ideia.”