TSE e PGR questionam aplicação da medida e ainda falta definição sobre quais municípios a adotarão
Aprovado pelo Congresso Nacional durante a “minirreforma eleitoral” em 2015, o voto impresso deve começar a valer a partir das eleições de outubro deste ano. O objetivo propagado pelo autor da emenda, o deputado e pré-candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL), era acabar com qualquer chance de fraude no pleito a partir da possibilidade de conferência dos resultados.
A ideia é que uma cópia dos votos registrados na urna eletrônica sejam impressos e depositados em um recipiente acoplado e lacrado, sem qualquer contato do eleitor. Só que na prática a medida é considerada cara e inútil pelas autoridades.
Além de garantir a absoluta confiabilidade do sistema usado atualmente, o Tribunal Superior Eleitoral afirma não ter dinheiro para cumprir a novidade no pleito deste ano. A corte estima em 1,8 bilhão de reais o custo para a adoção integral da medida, algo que será possível apenas em 2028.
Para este ano, o TSE afirma ser possível introduzir o voto impresso em 5% do total de 30 mil urnas usadas no pleito. Não há definição, entretanto, de quais municípios adotarão a mudança. Isso será definido até setembro em cada tribunal regional eleitoral, que terá à disposição uma quantidade de urnas com impressora proporcional ao eleitorado de cada estado.
Só que se depender da Procuradoria-Geral da República, nem mesmo a quantidade mínima de urnas com impressora prevista pelo TSE deve ser utilizada este ano. O órgão questiona, no Supremo Tribunal Federal, a constitucionalidade da medida sob alegação de que ela “desrespeita frontalmente o sigilo de voto”.
Para Raquel Dodge, o texto da lei é ruim. “A norma não explicita quais dados estarão contidos na versão impressa do voto, o que abre demasiadas perspectivas de risco quanto à identificação pessoal do eleitor, com prejuízo à inviolabilidade do voto secreto”, diz. O julgamento está previsto para a sessão desta quarta-feira do STF. Em parecer enviado à corte, o TSE afirmou que o método representa “inegável retrocesso no processo de apuração das eleições”.
Outro ponto reiterado tanto pelo TSE quanto pela procuradora-geral é que a impressão do voto sequer será efetiva para prevenir fraudes. Isso porque nada impediria a manipulação dos votos impressos a partir da abertura dos recipientes que os guardam. Para a Justiça Eleitoral, o sistema de conferência só faria sentido se cada “recibo” de voto identificasse o eleitor de alguma forma, o que é proibido pela Constituição em razão da óbvia violação do sigilo.
Ou seja: para funcionar, o novo sistema deve ser capaz de garantir que os votos impressos que saem das urnas eletrônicas de todo o país sejam exatamente os mesmos que foram depositados pelos eleitores. De acordo com técnicos do TSE, isso só seria possível com algum tipo de identificação. Se durante a recontagem um voto impresso se perde ou é trocado, o processo está “contaminado”.
Correções
No início de maio, o TSE concluiu a última etapa de um teste público de segurança das urnas eletrônicas. De acordo com a corte, investigadores externos que identificaram possíveis vulnerabilidades do sistema avaliaram as correções feitas pelos técnicos do tribunal.
Chefe do setor de voto informatizado do TSE, Rodrigo Coimbra diz que todas as medidas implementadas foram efetivas e sanaram os problemas apontados. “Os investigadores que participaram da última edição trouxeram contribuições valorosas para a melhoria da segurança do software da urna”, afirmou na ocasião.
O secretário de Tecnologia da Informação do TSE, Giuseppe Janino, lembra que, embora não haja registro de fraude comprovada nos 20 anos de utilização do sistema eletrônico de votação no Brasil, ao longo do período foram criados vários mecanismos de auditoria dos softwares com o objetivo de ampliar a segurança do sistema, entre eles os testes públicos de segurança.
Contratempos
Além das restrições quanto ao mérito da existência do voto impresso, sua implantação sofre com outros contratempos. O Tribunal de Contas da União (TCU) constatou atrasos relacionados à licitação para a aquisição dos módulos de impressão de votos (MIV) e à especificação do modelo.
O TCU fez uma lista dos problemas que tornam apertado o tempo para a disponibilizar os módulos de impressão de voto. O primeiro deles foi a tentativa mal sucedida de desenvolvimento de um modelo de urna eletrônica que incorporasse a impressão de votos em uma peça única. A empresa contratada não conseguiu concluir um protótipo a tempo de o TSE licitar.
Depois, veio a opção de adquirir módulos de impressão que pudessem ser acoplados às urnas já existentes. “Mas essa mudança de rumo resultou em perda de tempo”, avaliou o TCU. Um outro pregão chegou a ser cancelado em decorrência da desclassificação da vencedora e do desinteresse da única outra licitante em assumir os preços da primeira.
Houve nova licitação, para a qual já existe uma empresa declarada vencedora. O prazo final para a entrega dos modelos de impressão dos votos pela contratada ao TSE passou a ser o dia 10 de setembro. Mesmo assim, o TCU alerta para eventuais atrasos, já que não há produto similar no mercado.
O TCU chegou a mencionar a hipótese de o Supremo conceder liminar barrando a implantação do voto impresso em 2018. Para a Corte de Contas, esse é um motivo que justifica a adoção gradual do voto impresso, como definido pelo TSE.