Presidente escolhe o general Paulo Sérgio como novo comandante do Exército, num aceno à caserna, após a crise deflagrada com as demissões nas Forças Armadas. Mesmo assim, mal-estar com a cúpula ainda não foi superado. Marinha e Aeronáutica também têm novos chefes
Apesar de ser o terceiro na lista dos mais antigos entre os generais quatro estrelas, Paulo Sérgio Oliveira foi escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro como comandante do Exército. O militar, que dirigia o Departamento-Geral de Logística (DGP) da Força, substituirá Edson Leal Pujol, demitido pelo chefe do Planalto, após uma série de embates que resultou na troca do ministro da Defesa e dos comandantes das Forças Armadas. A nomeação de Paulo Sérgio foi a maneira encontrada por Bolsonaro para aliviar a tensão e evitar a perda total de apoio da caserna.
Na Marinha, assume o almirante Almir Garnier dos Santos, no lugar do almirante de esquadra Ilques Barbosa Júnior; e na Força Aérea Brasileira (FAB), o tenente-brigadeiro do ar, Carlos de Almeida Baptista Junior, que ocupará a vaga aberta com a saída do tenente-brigadeiro Antonio Carlos Moretti Bermudez. Garnier era o segundo da lista de antiguidade, e Baptista Junior, o primeiro, o que mostra que Bolsonaro quis seguir o critério estipulado entre militares.
Mesmo com a escolha, a cúpula das Forças Armadas ainda não engoliu a demissão coletiva dos chefes de Exército, Marinha e Aeronáutica, fato inédito, que abriu a maior crise entre o governo e os militares em 50 anos de história. Mas a avaliação, por ora, é de que o Executivo ganhou pontos com as nomeações e entendeu o recado claro de que as Forças Armadas são instituições de Estado, não de governo, portanto, não aceitarão qualquer investida autoritária.
Respeitado no meio militar, Paulo Sérgio estava, até agora, à frente das ações de combate à pandemia dentro da força-terrestre. A difícil missão de enfrentar o maior desafio de saúde pública do século foi dada a ele em março do ano passado, quando o Brasil registrava os primeiros casos da covid-19. A entrevista concedida pelo general ao Correio, publicada no último domingo, acabou sendo o estopim para a crise entre o governo e os militares. Ele destacou as ações de combate ao novo coronavírus, adotando medidas restritivas, que são refutadas pelo chefe do Executivo. Sob a gestão dele, o DGP estabeleceu campanhas massivas para uso de máscaras, distanciamento social, testagem em massa e higienização das mãos.
O resultado foi uma taxa de mortalidade de 0,13% na Força, enquanto na população em geral é de 2,5%. Nos hospitais militares, os medicamentos utilizados são baseados em recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Em sentido oposto, o Ministério da Saúde chegou a adotar protocolo endossando o uso de medicamentos sem comprovação científica comprovada contra a doença, como hidroxicloroquina e ivermectina. Sob a gestão de Paulo Sérgio, esses medicamentos só podem ser usados em consenso entre médico e paciente, e o doente deve assinar um termo de responsabilidade reconhecendo os riscos de fazer uso de remédios sem eficiência contra a covid-19.
Na entrevista, Paulo Sérgio enfatizou: “Os números são relativamente bons em relação à população em geral, por conta da prevenção que temos. O índice de letalidade é muito baixo, menor do que na rede pública, graças a essa conscientização, essa compreensão, que é o que eu acho que, se melhorasse no Brasil, provavelmente, o número de contaminados seria bem menor”.
Irritado com a entrevista e sem diálogo com Pujol, Bolsonaro decidiu demitir o então ministro da Defesa, Fernando Azevedo, que não compartilha da ideia de politizar os quartéis. Em seguida, foram dispensados os comandantes das Forças Armadas.
“Prerrogativa”
A apresentação dos novos comandantes foi curta, não durou mais do que cinco minutos. Braga Netto leu uma declaração, destacando que a nomeação dele é uma prerrogativa constitucional do presidente da República. O novo ministro destacou que o desafio do país, no momento, é o combate à covid-19 e que todo o governo “tem mobilizado seus esforços e energias para o enfrentamento dos impactos desta pandemia”.
“As Forças Armadas são fatores de integração nacional e têm contribuído, diuturnamente, nessa tarefa com a Operação Covid-19, com inúmeras atividades, entre elas, a de logística de transporte de EPIs (equipamentos de proteção individual) e oxigênio, a evacuação de pacientes de Manaus para todo o país e a vacinação de povos indígenas em áreas remotas”, frisou. “Os militares não faltaram no passado e não faltarão sempre que o país precisar.” Ele emendou dizendo que as três Forças “se mantêm fiéis às suas missões constitucionais de defender a pátria, garantir os poderes constitucionais e as liberdades democráticas”.
Perfis
Trabalho no Ministério da Defesa
O almirante de esquadra Almir Garnier Santos, de 60 anos, atuava, desde 2019, como secretário-geral do Ministério da Defesa. Natural do Rio de Janeiro, formou-se na Escola Naval em 1981 e chegou ao cargo de almirante em novembro de 2018. Foi diretor de Telecomunicações da Marinha, entre 2004 e 2006. De 2009 a 2010, foi chefe de gabinete do ministro da Defesa, Nelson Jobim, no governo do presidente Lula. Entre 2014 e 2017, Garnier também trabalhou como assessor especial militar do Ministério da Defesa, nas gestões de Celso Amorim, Jaques Wagner, Aldo Rebelo e Raul Jungmann.
Atuação na Amazônia
O general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira tem 59 anos, 44 deles de serviço efetivo no Exército. Nascido no Ceará, foi comandante militar do Norte, estudou na Escola Preparatória de Cadetes do Exército e na Academia Militar das Agulhas Negras. Foi chefe do Estado-Maior do Comando Militar do Oeste e é um dos integrantes do Alto-Comando do Exército. Na Força, é visto como alguém com perfil moderado, técnico e organizado. Ao longo dos últimos anos, especializou-se na atuação na área da Amazônia, tanto em logística, quanto em segurança de fronteira e na saúde.
A exemplo do pai
O tenente-brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior, da Aeronáutica, nasceu no Rio de Janeiro e ingressou na Força Aérea Brasileira em março de 1975, tendo sido promovido a tenente-brigadeiro em março 2018. O oficial tem 4 mil horas de voo, sendo 2,2 mil horas em aeronaves de caça. Ele estava à frente do Comando-Geral de Apoio. Baptista Júnior ocupará o cargo que já foi pai — Carlos de Almeida Baptista comandou a Aeronáutica entre dezembro de 1999 e janeiro de 2003, no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso.