Ministro apela por “cooperação internacional” para melhorar a distribuição de imunizantes, a fim de permitir uma recuperação mais homogênea da economia mundial. Ocorre que o Brasil, na OMC, é contrário à quebra temporária de patentes de vacinas
Diante do agravamento da pandemia da covid-19 no Brasil, que figura no epicentro global dos contágios e de mortes, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tentou, mais uma vez, reforçar a necessidade de acelerar a vacinação contra o novo coronavírus, apesar de o presidente Jair Bolsonaro ainda não ser tão enfático nessa questão.
Ontem, o chefe da equipe econômica defendeu a “cooperação internacional” no financiamento e na distribuição da vacina para integrantes do Fundo Monetário Internacional (FMI), em um visível esforço para melhorar a imagem do país — que enfrenta sérias dificuldades em avançar na imunização.
“A cooperação internacional é fundamental para garantir que as vacinas se tornem adequadamente disponíveis em cada país. Apelamos aos setores público e privado, bem como às organizações multilaterais e à cooperação bilateral para ajudar a preencher as lacunas de financiamento e distribuição, inclusive incentivando transferência de tecnologia e licenciamento voluntário de propriedade intelectual”, escreveu Guedes, em documento em que ele se apresenta liderando o grupo composto por Brasil, Cabo Verde, República Dominicana, Equador, Guiana, Haiti, Nicarágua, Panamá, Suriname, Timor-Leste e Trinidad & Tobago.
“Embora haja motivos para otimismo cauteloso, a recuperação tem sido desigual e sujeita a alta incerteza. Dito isso, vemos os países melhorando em ritmos diferentes”, complementou o ministro. A declaração do chefe da equipe econômica antecede o encontro de primavera (no Hemisfério Norte) do FMI que ocorre durante esta semana. Guedes participa da reunião ministerial do Comitê Monetário e Financeiro Internacional dos representantes dos países membros nesta quarta-feira (8).
Apesar do apelo de Paulo Guedes por uma cooperação internacional em favor das vacinas, o Brasil resiste a medidas que poderiam contribuir para a causa. O governo brasileiro é contrário à quebra temporária de patentes de vacinas, assunto em debate na Organização Mundial do Comércio. Ontem, em pronunciamento, o senador Paulo Paim (PT-RS) pediu que o Brasil mude de posição. Ele classificou como um absurdo que mais de 100 países pobres ainda não tenham começado a vacinação e criticou os que veem a produção de vacinas como uma questão apenas comercial e visando ao lucro.
“A chamada quebra de patentes ou licença temporária é uma solução viável, ou seja, a fórmula, a receita, para se produzir a vacina se tornaria pública, um bem público da humanidade e dessa maneira, os laboratórios dos países pobres e em desenvolvimento poderiam também produzir, como é o caso do Brasil”, ressaltou.
Paim afirmou que, de acordo com especialistas, o Brasil poderia começar a produzir as vacinas em um prazo de 90 dias, se fosse aprovada a licença temporária. Assim, além de ter condições de vacinar toda a população a um custo bem menor, o país ainda poderia fornecer vacinas a outras nações.
Novas projeções
A carta de Paulo Guedes foi divulgada pouco depois de o FMI apresentar as novas projeções para a economia mundial. O relatório Panorama Econômico Global aponta recuperações divergentes da crise provocada pela pandemia em 2020 e ainda destaca a vacinação como enorme desafio à frente. O organismo multilateral elevou de 5,5% para 6%, a previsão do Produto Interno Bruto (PIB) global de 2021. O Brasil, que está mais atrasado na vacinação contra a covid-19, deve registrar um PIB de 3,7%, abaixo da média global e da América Latina, de 4,6%.
Ao comentar sobre o Brasil, a economista-chefe do FMI, Gita Gopinath, reconheceu que os estímulos fiscais do governo ajudaram a reduzir a queda do PIB brasileiro em 2020, e que, neste ano, o país poderá aproveitar a recuperação melhor da economia global. No entanto ela sublinhou que a vacinação em massa será fundamental para o país voltar a crescer de forma mais robusta. “A prioridade número um do Brasil é uma vacinação em ritmo mais acelerado do que a que temos visto no momento atual”, frisou Gopinath.
Na carta ao FMI, o chefe da equipe econômica brasileira reconheceu a diferença no ritmo global de recuperação econômica, sobretudo, ao avanço desigual da vacinação contra a covid-19. “Diferentes ritmos de implantação de vacinas aumentam as assimetrias entre países em desenvolvimento, especialmente de baixa renda, enfrentando maiores desafios”, escreveu. Por conta disso, Guedes defendeu que o “acesso equitativo às vacinas é o investimento de maior retorno global”. “A disponibilidade e o ritmo da vacinação são um fator-chave para acelerar a recuperação e, portanto, o reequilíbrio fiscal”, reforçou.
Para Guedes, o espaço remanescente para uso da política fiscal, os recursos estruturais e as novas variantes da covid-19 também têm afetado o ritmo da recuperação econômica pelo globo. Ele afirmou, porém, que países em desenvolvimento que contam com um grande número de trabalhadores informais, como o Brasil, podem acelerar esse crescimento, já que “a flexibilidade nesses setores pode levar a uma resposta mais forte”.
O ministro da Economia defende a vacinação dos trabalhadores informais brasileiros nos próximos três ou quatro meses, isto é, ao mesmo tempo em que esses trabalhadores recebem o novo auxílio emergencial, que começou a ser pago nesta semana. Para ele, a imunização em massa vai permitir o “retorno seguro ao trabalho” e, assim, a recuperação da economia brasileira.
Em evento para investidores estrangeiros organizado pelo Itaú Unibanco, Guedes afirmou, ontem, que, neste ano, a pandemia de covid-19 terá um impacto “menor e mais curto” na atividade econômica do Brasil que no ano passado. No mesmo evento, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto reforçou, por sua vez, que a vacinação contra a covid-19 vai trazer “boas notícias” para a economia brasileira no segundo semestre.
“O que precisamos fazer é ter mais vacina e vacinar o mais rápido que podemos. Vacinando um milhão de pessoas por dia, o impacto na economia é enorme. As simulações mostram isso. Então, todo o esforço tem que estar nessa direção”, defendeu. Campos Neto acredita em retomada da atividade a partir do segundo semestre.
Senado aprova prorrogação do IR
O Senado aprovou, ontem, projeto de lei que prorroga o prazo de entrega da declaração do Imposto de Renda para Pessoa Física até 31 de julho. Como houve alterações, a proposta voltará para a Câmara dos Deputados antes de ser encaminhada à sanção do presidente da República, Jair Bolsonaro. O Planalto avalia vetar a prorrogação em razão do impacto na arrecadação fiscal. Como o pagamento do imposto pelos contribuintes poderá ser feito em até oito parcelas, as três primeiras cotas que venceriam em abril, maio e junho seriam prorrogadas para julho, agosto e setembro. Segundo o Ministério da Economia, a mudança adiaria o fluxo de arrecadação em R$ 13,2 bilhões e pode afetar o cronograma das restituições. A proposta original aprovada na Câmara adiava o pagamento das duas últimas parcelas de quem tem imposto a pagar para janeiro e fevereiro de 2022, tirando R$ 2,6 bilhões da arrecadação prevista para este ano e adiando essa receita para o ano que vem. Nesse ponto, o relator do projeto no Senado, Plínio Valério (PSDB-AM), concordou em mexer, reduzindo de oito para seis parcelas e deixando todo o pagamento dentro de 2021. Ele manteve, porém, a prorrogação da declaração. “Procurei fazer o que é bom para a população e que não seja ruim para a União”, disse.