Fundação americana divulga uma lista de critérios científicos e éticos para considerar se uma espécie extinta deve ser ‘ressuscitada’ pelos pesquisadores
Seja por causas naturais, seja em consequência de ações humanas, espécies variadas de plantas e animais foram extintas ao longo dos milênios. Com os avanços recentes na ciência, e principalmente da biotecnologia, cientistas têm a possibilidade de trazer algumas dessas espécies de volta à vida — a dúvida agora é se alguns desses animais devem passar pelo processo. Para fornecer informações que ajudem na discussão do tema, a fundação americana The Long Now, criada pelo biólogo Stewart Brand, fez uma lista de critérios científicos e éticos que deveriam ser considerados em relação à “desextinção” (neologismo que vem do inglês deextinction), e enumerou alguns dos animais desaparecidos que se encaixariam nesses pré-requisitos.
“O objetivo de cada nível de resgate genético é restaurar a espécie até sua total saúde genética”, afirma o portal da fundação. Os métodos para salvar animais ainda ameaçados da extinção ou ressuscitar uma espécie já extinta, no entanto, podem variar dependendo do material genético disponível.
Impacto no ambiente
Trazer um ser vivo de volta à vida nunca é uma decisão fácil para os cientistas porque traz impacto ambiental, seja para a vegetação, seja para o equilíbrio da cadeia alimentar. Por isso, é necessário fazer uma série de considerações antes de iniciar um processo de resgate ou de-extinção de uma espécie.
A lista desenvolvida pela fundação americana leva em consideração critérios que vão desde a viabilidade científica para o procedimento – como a quantidade de material genético disponível, o tempo que a espécie permaneceu extinta, se existe algum parente próximo vivo – até a chance de sobrevivência na natureza e os benefícios que o resgate ou ressuscitação trariam.
No caso de espécies que desapareceram, uma técnica de edição do genoma poderia ser utilizada para trazer alguns indivíduos de volta. “O truque seria transferir os genes que definem as espécies extintas no genoma de espécies descendentes, efetivamente convertendo-as em uma versão viva das criaturas extintas”, explica o portal. Esse procedimento envolve transferência massiva de genes, assim como clonagem, cruzamento e inserção de embriões entre espécies diferentes.
Confira sete animais que estão na lista de candidatos para “desextinção”:
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1. Mamute
(Photoresearchers/Latinstock/VEJA)
Segundo os critérios de desextinção avaliados pela lista da Fundação Long Now, os mamutes poderiam ser uma das espécies ressuscitadas. Eles foram extintos há menos de 800.000 anos, já tiveram seu DNA sequenciado e possuem um parente próximo vivo, o elefante asiático (Elephas maximus), que possivelmente conseguiria ser usado para produzir filhotes. Além disso, estudos indicam que esses animais apresentavam um comportamento muito parecido com o dos elefantes que conhecemos, o que tornaria possível que sobrevivessem sem seus pais naturais, no ambiente atual. Em relação ao habitat, pesquisadores já estão trabalhando para restaurar o “estepe de mamute”, um tipo de pasto que correspondia ao principal alimento desses animais. A sociedade também mostrou-se receptiva à ideia, e trazer esses animais pré-históricos de volta à vida poderia trazer benefícios econômicos por meio do ecoturismo, além de ser de grande importância para a ciência. No entanto, as causas originais da sua extinção (possivelmente mudanças climáticas e a caça) ainda não foram completamente solucionadas, tornando incerto o futuro da espécie.
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2. Tigre-da-tasmânia
(John Gould/Reprodução)
Conhecidos também como lobos-da-tasmânia (Thylacinus cynocephalus), esses marsupiais que mais se parecem com cachorros foram extintos no século passado – principalmente por causa da sua fama de assassinos de ovelhas, que levou à perseguição desses animais. Alguns indivíduos foram conservados inteiros em álcool, fornecendo material genético mais do que suficiente para uma possível ressuscitação. No entanto, o único possível parente próximo do tigre-da-tasmânia é o diabo-da-tasmânia (Sarcophilus harrisii), e os cientistas ainda não sabem se ele poderia ser usado para criar filhotes da espécie extinta, tornando a viabilidade do processo cientificamente incerta. Apesar disso, as causas de sua extinção foram resolvidas, o habitat desses animais permaneceu praticamente inalterado e provavelmente seria possível controlar novas ameaças. Do ponto de vista econômico e social, o tigre-da-tasmânia também apresenta vantagens, trazendo benefícios ecológicos e talvez estimulando o ecoturismo – o que faria dele um bom candidato para ser “desextinto”. Contudo, ainda não se sabe se esses animais conseguiriam se reproduzir em cativeiro e se seriam capazes de viver sem seus pais naturais.
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3. Leão-das-cavernas
(/Divulgação)
Possível antepassado do leão africano (Panthera leo), o leão-das-cavernas (Panthera leo spelaea) é talvez pudesse ser ressuscitado com sucesso pela ciência. Ainda que não se saiba ao certo se os filhotes produzidos a partir de seu parente genético seriam viáveis, ou se existe material genético suficiente para fazer o sequenciamento do DNA. Se isso for possível, trazer o grande felino de volta à vida talvez seja cientificamente possível. Esses animais conseguiriam se reproduzir em cativeiro e suportar o ambiente atual, embora os cientistas estejam em dúvida se existiria habitat suficiente para a espécie ou se as causas da sua extinção (mudanças climáticas e diminuição da megafauna que levou ao desaparecimento das presas), além de novas ameaças poderiam ser controladas. O que se sabe é que o leão-das-cavernas teria um importante papel ecológico — seus benefícios econômicos, assim como a relevância para a ciência, porém, são duvidosos.
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4. Burcado
(/iStock)
Também chamado de íbex-dos-pireneus (Capra pyrenaica pyrenaica), essa espécie parecida com uma cabra cumpre praticamente todos os pré-requisitos da desextinção: desapareceu recentemente (no início do século XXI), possui DNA suficiente para ser sequenciado e é parente próxima da cabra espanhola (Capra pyrenaica), que poderia ser usada produzir crias viáveis. Além disso, a causa original da sua extinção, que foi a destruição do seu habitat natural, já foi resolvida com a criação de parques protegidos. A recepção por parte da sociedade também é positiva e a espécie poderia trazer benefícios econômicos. As únicas dúvidas, porém, são em relação à viabilidade da sua reprodução em cativeiro e ao comportamento que esses animais teriam na natureza sem seus pais naturais. Os cientistas também questionam se trazer os burcados de volta à vida beneficiaria outras espécies ou teria algum significado para a ciência.
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5. Preguiça gigante
(Tomas Rangel/VEJA)
Apesar de serem parentes próximos das preguiças-de-três-dedos (Bradypus variegatus) que conhecemos atualmente, esses enormes animais pré-históricos não poderiam ser ressuscitados pelos cientistas. Extintas há 10.000 anos, bem menos do que o tempo estipulado pelos critérios da lista, o único material genético que poderia ser utilizado para sequenciar o DNA da preguiça gigante (Bradypus tridactylus) está na forma de restos de ossos encontrados pelos cientistas, o que poderia não ser suficiente para tornar a desextinção cientificamente possível. Além disso, as preguiças comuns são pequenas demais para carregar filhotes da sua versão gigante e pré-histórica.
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6. Mariposa Azul de Xerces
(/Divulgação)
Extinta na década de 40, a mariposa azul de Xerces (Glaucopsyche xerces) é uma das espécies que, segundo os cientistas, talvez seja uma boa candidata para a desextinção. Embora não se saiba ao certo se sua ressuscitação é cientificamente possível – os pesquisadores têm dúvida se a borboleta Palos Verdes (Glaucopsyche lygdamus palosverdesensis), parente próxima da mariposa, poderia ser utilizada para reprodução –, o comportamento desses insetos é condicionado pelo meio em que vivem, fazendo com que eles possam se adaptar à natureza sem seus pais naturais. Ainda assim, a espécie pode enfrentar algumas possíveis ameaças, já que a causa exata de sua extinção não foi identificada. Em relação aos benefícios que a desextinção poderia trazer para a sociedade ou para o ambiente, ainda não é possível afirmar muita coisa, porém os cientistas acreditam que bem-estar desses animais na natureza poderia ser assegurado.
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7. Dinossauro
(Jakob Vinther/University of Bristol/Divulgação)
Quanto aos gigantes répteis pré-históricos que habitavam nosso planeta milhões de anos atrás, os cientistas afirmam que não seria possível trazê-los de volta. Dinossauros foram extintos há mais de 800.000 anos, o que significa que além de não existir material genético em qualidade e quantidade suficiente para ressuscitá-los, tornando sua desextinção cientificamente impossível, o ambiente mudou drasticamente depois que esses animais desapareceram, fazendo com que sua sobrevivência seja pouco provável. Além disso, mesmo se cumprissem todos os pré-requisitos anteriores, os dinossauros não têm parentes próximos que pudessem ser usados para reprodução.